Mundo

Mundo em desarranjo

À medida em que o presidente francês, Emmanuel Macron vai ficando cada vez mais acuado pelos protestos que paralisam o país, comparações com os protestos de 2013 no Brasil começam a emergir com cada vez mais frequência. Claro, as semelhanças estão aí, principalmente na ânsia de apresentar-se como algo espontâneo, orgânico, desassociado de qualquer forma de organização, digamos, tradicional – partidos, sindicatos, movimentos populares…

A novidade? Até agora, esse tipo de protesto vinha acontecendo em países com governos progressistas. E Macron pode ser acusado de tudo, menos de ser progressista. Ou seja, há algo ainda mais forte por trás desses movimentos: uma profunda ansiedade anti sistêmica, contra “tudo isso que está aí”, independentemente do governo de ocasião.

O problema é que, ao invés de responder a essa ansiedade com novas formas de organização, com uma resignificação do que é a política e sua importância para a reconstrução do tecido social, o que vemos é justamente o contrário: o retorno aos erros do passado – inclusive de formas tão caricaturadas que chegam a ser humilhantes, como estamos vendo no Brasil.

O G20 é outro bom exemplo disso. O encontro, que marcou a primeira visita oficial de Trump à América Latina, terminou como vem terminando a grande maioria dos encontros multilaterais: como uma declaração que mais parece a pedra que faltava para enterrar todas os instrumentos de concertação internacional. O foco deixa de ser a construção de relações amplas entre os países, para dar ênfase a relações bilaterais desiguais – ou seja, que favorecem amplamente os mais fortes, enquanto outros se vêem obrigados (ou o fazem de vontade “própria”) a se submeterem à condições absolutamente desfavoráveis a seus interesses nacionais. Aqui, de novo, o Brasil se presta a catalisador do movimento engendrado pelos Estados Unidos — enquanto, Rússia, Índia e China reforçam as discussões sobre cooperação em temas de economia e segurança. Já vimos esse filme.

Falando em caricaturas, não poderia terminar a coluna dessa semana sem falar de uma das mais caricatas figuras do cenário internacional, o secretário-geral da OEA, Luis Almagro. Por anos, Almagro vem ignorando as profundas violações de direitos humanos no México. Mas foi só López Obrador assumir a presidência, que o país voltou a existir, assim, num passe de mágica. O que reforça a leitura de que há uma tendência cada vez mais aberta de usar os foros multilaterais para atacar países não-alinhados, enquanto as decisões de real importância acontecem a portas fechadas, bem longe do escrutínio público.

Enfim, estaríamos diante de um rearranjo de forças capaz de significar uma quebra permanente no estado de coisas? Ou seria somente um período de reacomodação dentro do mesmo esquema? Os protestos na França, a eleição de deputados de extrema-direita em Andaluzia, López Obrador no México… São respostas distintas para o mesmo problema, a precarização e a desesperança, frutos de um sistema em franca decadência.

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